Wednesday, August 18, 2004

o banco de madeira encontra-se no centro da sala.
no centro equidistante do cosmos e da vida,
no centro da flor e da pedra,
no centro onírico da visão e da prece.

no banco a criança existe em si mesma,
no banco a criança morre através do esperma
que lhe sai escondido,
no banco a criança vive pelo gume.

a criança dorme ou hiberna sentada,
come pela boca do silêncio de olhos cerrados,
sonha-se a si mesma mais tarde
devorando o centro do cosmos,
com os dentes canibais de quem come a carne.

e o seu corpo existe nu,
em suave aveludada pele.
pele bacante de asas suaves,
pele filosofal.
corpo despido de orgulho
corpo de vergonha silenciosa
corpo de madeira, banco com veias.
total dissoluto e esquecido.

a criança lacrimeja em gargalhadas de leite,
cuspindo pelo umbingo restícios de um nascimento antigo.

a criança sofre e morre pelo banco adentro,
embalada pelo ritmo das estrelas de aço,
desventrada pelos sexos sagazes e mudos.

no centro um banco nato-morto e desfocado
pelos olhos peixe-aranha do cosmos

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